sexta-feira, 24 de julho de 2015

Internet das Coisas: O outro lado da Conveniência

Na edição do próximo domingo (Jornal Diário do Minho-26/7) irei abordar o Relatório McKinsey-O Outro lado da Internet das Coisas. Trata-se da visão otimista- funcional e economicamente falando-, positiva, portanto, dos efeitos da IOT no nosso quotidiano, rebatendo, assim, os que não acreditam no lado saudável desta relação máquina-máquina  e na produção de informação através de sensores que permite uma gestão na hora de todas as áreas de intervenção municipal e com as quais os cidadãos interagem no seu quotidiano. A reflexão no próximo domingo é um contraponto sugerido por um autarca em resposta ao texto que escrevi naquele jornal intitulado "Uma verdade inconveniente" e que aqui reproduzo:


A verdade inconveniente.

Nesta história não há vencedores nem vencidos, mas uma realidade, que escapa ainda à sensibilidade das cidades portuguesas, mas é viral nos quatro cantos do mundo onde há já uma longa experiência no desenvolvimento de projetos  de base tecnológica. Trata-se da necessidade de repensar o conceito e a aplicação de medidas associadas às cidades ditas inteligentes.
O relatório inglês elaborado pelo Fundação Nesta dá nos uma dimensão global do problema desde Amesterdão, a Beijing, de Londres a Jacarta-realidades e culturas distintas com o mesmo problema: investimentos com pouco retorno e primazia da tecnologia em desfavor da resolução dos problemas concretos dos cidadãos- nada que eu já não tenha aqui referido.
. O documento da autoria de Tom Saunders e Peter Baeck é claro na avaliação ao chumbar muitas das ações desenvolvidas naquelas cidades, criando um divórcio entre a sociedade e a gestão urbana .  Intitulado “Repensar as cidades inteligentes a partir do zero”, nomeiam alguns “pecados mortais”:  começar o projeto com a aplicação de tecnologia que não responde aos problemas da sociedade; dificuldade e insuficiência na demonstração das evidências; falta de comparação com as metodologias e resultados noutras cidades e pouco envolvimento dos cidadãos.
Em resposta a estas insuficiências, os especialistas apontam a necessidade de uma maior coordenação que coloque os cidadãos no centro dos projetos, utilizando o seu potencial inovador, mobilizando o conhecimento coletivo e envolvendo as pequenas  empresas. Mais, é importante que as cidades apostem em pessoas inteligentes e não apenas em tecnologias inteligentes. Os recados no Relatório são claros para quem pretende ser líder de uma cidade inteligente: “tenham a mesma consideração pelas pessoas do que tem pelas tecnologias”, defendendo, por exemplo, a criação de laboratórios públicos de acesso fácil as pessoas para que possam dar o seu contributo nas mais variadas formas. Um argumento que vem na senda do pensamento do especialista Phil Beard que acaba de trocar a IBM pela Amey onde é responsável pela gestão da dados e onde o espera tarefa de construir um novo conceito de cidade inteligente. Num balanço ao que tem sido feito no Reino Unido, mercê da adesão massiva das ciddes a plataformas tecnológicas para incrementarem o conceito, Phil Beard não tem papas na língua ao considerar que existem seis verdades inconvenientes em torno deste conceito: a primeira é pensar que a cidade inteligente 8Smart City) é um conceito tecnológico quando efetivamente se trata de uma mudança na politica que adapta uma das mais poderosas forças económicas e sociais do nosso tempo (a tecnologia) às necessidades dos lugares onde a maior parte das pessoas vivem. Por outro lado, as cidades nunca serão inteligentes se os seus líderes não se envolverem e em terceiro não se pode deixar as cidades à mercê do mercado,” precisamos de coragem para moldar o mercado”. Outras das verdades inconvenientes lembra-nos o divórcio entre as necessidades das pessoas que desejam uma vida melhor para si, para as famílias, negócios e comunidade e os recursos existentes nem sempre distribuídos de modo a que cada um possa ter a oportunidade de melhorar a sua vida. A juntar estas quatro verdades inconvenientes aquele especialista acrescenta a necessidade de contar a verdade às pessoas, lembrando, por fim, que ninguém poderá fazer este trabalho por nós, temos de ser nós a fazê-lo por nós próprios.
As duas visões clarificam e consolidam aquilo que é hoje fruto de debate na União Europeia: uma deturpação do conceito, uma má avaliação do seu potencial e um uso desproporcionado da tecnologia. Coincidência ou não, a agência especializada para as tecnologias de informação das Nações Unidas  anunciou esta semana a criação de  um grupo de estudo para a definição de requisitos que normalizem o uso da Internet das Coisas, nomeadamente quando se aplicam às cidades inteligentes. Uma preocupação que caminha lado a lado com o desenvolvimento de novos conceitos tecnológicos que não param de evoluir: a computação cognitiva nas cidades, abordada esta semana em Lisboa, é um deles- uma evolução que nos deve fazer refletir sem anátemas  nem visões glorificantes.



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